É costumeiro ouvirmos falar sobre o abandono afetivo dos pais em relação aos filhos, o que, inclusive, tem gerado em nossos tribunais diversas indenizações, que surgem não como uma forma de compelir o outro a amar o filho, mas de responsabilizá-lo pela conduta omissiva que ocasionou uma lesão emocional a prole.
O Código Civil, em seu art. 186, é claro ao afirmar que aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito, sendo obrigatório o reparo do dano.
Assim, por óbvio que a pecúnia não visa substituir os laços afetivos, mas é uma forma/tentativa de diminuir a dor, a solidão e o desamparo suportado por aquele que deveria ter sido cuidado e amado.
Ainda, de acordo com artigo 5º do ECA (Estatuto da Criança do Adolescente) e o Código Civil em seu art. 1.638, haverá suspensão ou a extinção do poder familiar, para os pais que forem negligentes, discriminarem, explorarem, agir com violência, bem como atuarem com crueldade, ou seja, descumprirem com direitos fundamentais da criança.
Logo, resta o questionamento: e o inverso, é possível?
Ainda que de forma tímida, devido as divergências doutrinárias que se têm feito presentes em nossos tribunais, é o abandono afetivo inverso, ou às avessas ou invertido, absolutamente possível de ser tema de processos judiciais.
O abando afetivo invertido é a ausência de afeto e de cuidado dos filhos para com os seus genitores/pais. Normalmente o abandono afetivo inverso ocorre com idosos ou pessoas debilitadas, dada a dedicação que indivíduos com essas condições demandam.
Por tal fato, o Instituto Brasileiro de Direito de Família, em seu enunciado 10, aduziu ser cabível o reconhecimento do abandono afetivo em relação aos ascendentes idosos. E, a Constituição Federal preconiza em seu art. 229 que os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, ou seja, vislumbra a dignidade da pessoa humana, resguardando um envelhecimento digno.
A responsabilidade por um envelhecimento digno é um dever da família, da sociedade e do Estado, conforme também prevê o art. 3º do Estatuto do idoso.
“É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária”.
Assim, por certo que o dever de cuidar vai além do pagamento da pensão ao pai idoso/debilitado, deve haver amparo afetivo, zelo, cuidado, além de paciência e dedicação.
Ainda, é comum que a responsabilidade de cuidar do pai idoso/debilitado recai apenas sobre um filho. Porém, tal atitude não exime os demais filhos do dever de amparo, cabendo ao filho que cuida de o pai sozinho acionar o judiciário para que os demais cumpram com a sua parte, inclusive no quesito visitas. Da mesma forma que o pai idoso/debilitado pode recorrer ao judiciário, requerendo ajuda financeira para que possa sobreviver com o mínimo de dignidade.
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